HIPERATIVIDADE

A hiperatividade, também denominada, na medicina, transtorno do déficit de atenção –TDAH, pode afetar crianças, adolescentes e até mesmo alguns adultos. Os sintomas podem incluir problemas de linguagem e das habilidades motoras. Embora a criança hiperativa tenha muitas vezes inteligência normal ou acima da média, o estado é caracterizado por problemas de aprendizado e comportamento. Os professores e pais da criança hiperativa devem saber lidar com a falta de atenção, a impulsividade e a instabilidade emocional da criança.

O TDAH pode estar relacionado à perda da visão ou audição ou a problemas de comunicação – como a incapacidade de processar símbolos adequadamente. Pode surgir também estresse emocional, convulsões ou distúrbios do sono. O verdadeiro comportamento hiperativo interfere na vida familiar, escolar e social da criança.

As crianças hiperativas têm dificuldade em prestar atenção e aprender. São impulsivas. Não param para olhar ou ouvir. Devido à sua energia, têm infinita curiosidade e forte necessidade de explorar; por isso, são extremamente propensas a se machucar e a quebrar e danificar objetos. Também são incapazes de filtrar estímulos e então se distraem facilmente. As crianças hiperativas toleram pouco as frustrações. Elas discutem com os pais, professores, adultos e amigos. Fazem birras e seu humor flutua rapidamente.

Para perceber se uma criança é realmente hiperativa, é preciso notar vários desses sintomas. Uma criança ser agitada não significa que seja portadora do TDAH. Um dos sintomas que percebi em todos os meus alunos diagnosticados como hiperativos é que eles tendem a ser muito carentes e agarrados às pessoas. Precisam de atenção e de ser tranquilizados – o que nem sempre conseguimos proporcionar no ambiente escolar. É importante perceber que as crianças hiperativas entenderam as regras, instruções e expectativas sociais. O problema é que elas têm muita dificuldade em obedecer a essas regras, mas esses comportamentos são acidentais – e não propositais.

A criança hiperativa pode ter muitos problemas. Apesar da dificuldade para aprender, ela é quase sempre muito inteligente e sabe que determinados comportamentos não são aceitáveis. Mas, apesar do desejo de agradar e de ser educada e contida, não consegue se controlar. Isso pode gerar frustração, desânimo ou vergonha. Ela sabe que é inteligente, mas não consegue desacelerar o sistema nervoso a ponto de utilizar o potencial mental necessário para concluir uma tarefa.

Essas crianças muitas vezes se sentem isoladas dos colegas, mas não entendem por que são tão diferentes. Sem conseguir concluir as tarefas normais de uma criança na escola ou em casa, elas podem sofrer estresse, tristeza e baixa autoestima.

É muito importante que o professor tenha auxílio de um profissional de saúde mental para apoiar seu trabalho na escola – o que infelizmente não acontece. Além disso, é essencial que todos os docentes tenham ao menos uma noção básica da doença, que saibam reconhecer os sintomas e estejam preparados para as consequências em sala de aula. Saber diferenciar incapacidade de desobediência é fundamental.

Como afirma a psicóloga Résia Morais, “um especialista em comportamento infantil pode ajudar a distinguir entre uma criança normalmente ativa e enérgica e a criança realmente hiperativa. Até mesmo as crianças menores podem correr, brincar e se agitar, felizes, durante horas sem cochilar, dormir ou demonstrar qualquer cansaço. Para garantir que a criança realmente hiperativa seja tratada adequadamente – e evitar o tratamento inadequado de uma criança normalmente ativa –, é importante que a criança receba um diagnóstico preciso”.

O site Saúde do bebê dá uma sugestão importante para os pais: “Ao tratar da criança hiperativa, sua meta é ajudá-la a fazer o melhor possível em casa, na escola e com os amigos. Lembre-se sempre de que essa criança está lutando com todas as forças para superar uma deficiência do sistema nervoso. Se for preciso, explique mais de uma vez e não hesite em chamar sua atenção quando não se comportar bem”.

Não é fácil ser professor de várias crianças hiperativas na mesma sala de aula, mas espero que estas dicas ajudem a reconhecer e a auxiliar essas crianças a superar tantas dificuldades.

Epidemiologia de TDAH

Crianças com Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) – caracterizado por níveis excessivos de desatenção, hiperatividade e impulsividade, em termos de desenvolvimento – são mais frequentemente identificadas e tratadas no ciclo inicial do ensino fundamental. Estudos realizados no mundo todo revelam uma taxa de prevalência de TDAH equivalente a 5,29% – intervalo de confiança de 95%: de 5,01 a 5,56 – de crianças e adolescentes.1 As taxas são mais altas para meninos do que para meninas, e para crianças menores de 12 anos de idade do que para adolescentes.1,2 Estimativas de prevalência variam em função dos métodos de averiguação, dos critérios de diagnóstico utilizados e da inclusão ou exclusão de critérios de limitação funcional.1 Em termos gerais, as estimativas são muito semelhantes entre os países, com exceção dos países Africanos e do Oriente Médio, nos quais as taxas são mais baixas do que na América do Norte e na Europa.1

Os sintomas geralmente interferem no funcionamento acadêmico e comportamental na escola, e frequentemente atrapalham os relacionamentos com familiares e colegas.3,4 Crianças com TDAH utilizam mais os sistemas de saúde e estão mais sujeitas a lesões do que crianças que não apresentam esse transtorno. Embora os sintomas de hiperatividade diminuam na adolescência, a maioria das crianças com TDAH continua a apresentar algumas deficiências cognitivas – por exemplo, funcionamento executivo insatisfatório, memória de trabalho deficiente – ao longo da adolescência até a fase adulta, em comparação com pares da mesma idade.7,8Estudos de resultados identificam taxas menores de conclusão do ensino médio, início precoce de consumo de álcool e de substâncias ilícitas, e taxas elevadas de tabagismo e de acidentes de trânsito em meio a adolescentes com TDAH.9,14 A hiperatividade na infância está igualmente associada ao surgimento subsequentes de outros distúrbios psiquiátricos, entre os quais ansiedade, problemas de conduta, transtornos do humor, comportamento suicida e transtorno de personalidade antissocial.13,15-18 Adultos com histórico infantil de TDAH têm taxas acima do normal em relação a lesões e acidentes, dificuldades conjugais e no trabalho, gravidez na adolescência e crianças nascidas fora do casamento.15,17,19-21 TDAH é uma questão importante de saúde pública, não só devido às deficiências de longo prazo que afetam indivíduos e suas famílias, mas também devido ao pesado fardo que representa para os sistemas de educação, de saúde e de justiça criminal.22-24

Estudos sobre populações identificaram que desatenção e hiperatividade na infância são mais comuns em famílias monoparentais, naquelas cujos pais têm baixos níveis de realização educacional ou estão desempregados, e em famílias de baixa renda.17,25,26 Evidências de estudos sobre famílias revelam que sintomas de TDAH são altamente hereditários,27 embora fatores ambientais também influenciem o desenvolvimento inicial da criança. Históricos de tabagismo e consumo de álcool pela mãe no período pré-natal, baixo peso ao nascer e problemas de desenvolvimento estão associados a altos níveis de desatenção e hiperatividade.26,28 Recentemente, avaliações dos dados obtidos pelo Canadian National Longitudianl Survey of Children and Youth revelaram que aproximadamente 7% das crianças mostram níveis persistentemente altos de hiperatividade relatada pelos pais, desde os 2 anos de idade até os primeiros anos do ensino fundamental.29 Tabagismo no período pré-natal, depressão materna, práticas parentais inadequadas e viver em bairros menos favorecidos no primeiro ano de vida são fatores associados com futuros problemas comportamentais da criança, inclusive desatenção e hiperatividade constatadas quatro anos mais tarde.29-31

Na América do Norte, a identificação e o tratamento clínico de TDAH variam em função da localização geográfica, aparentemente refletindo diferenças nas práticas comunitárias ou no acesso a serviços.32-34 A utilização de medicamentos estimulantes para o tratamento de sintomas de desatenção e hiperatividade aumentou na primeira metade da década de 1990, o que provavelmente reflete utilização prolongada em tratamentos ampliados até a adolescência, assim como um aumento no número de meninas diagnosticadas e tratadas.35-38

Transtornos concomitantes (ou comorbidade)

Entre 50% e dois terços das crianças em idade escolar diagnosticadas com TDAH apresentam também transtornos psiquiátricos e de desenvolvimento concomitantes, entre os quais comportamentos agressivos e de oposição, ansiedade, baixa autoestima, transtornos de tiques, problemas motores, e deficiências de aprendizagem e de linguagem.39-46 São comuns as dificuldades relacionadas ao sono, entre as quais, enurese (micção noturna) e perturbações respiratórias durante o sono, um problema potencialmente corrigível que pode estar relacionado ao alto nível de desatenção.47,48 O nível de disfunção global em crianças com TDAH aumenta com o número de transtornos concomitantes.13,49 As condições concomitantes também aumentam a probabilidade de desenvolver outras dificuldades na adolescência e no início da vida adulta.10,15,16,50-55

Dificuldades neurocognitivas constituem fontes importantes de deficiências em crianças com TDAH. Problemas relacionados às funções executivas e à memória de trabalho, assim como a distúrbios específicos de linguagem e aprendizagem são comuns em grupos clínicos.56,57-64 Cerca de um terço das crianças encaminhadas para psiquiatria, muitas vezes devido a problemas comportamentais, podem ter dificuldades de linguagem não identificadas anteriormente.65 É necessário avaliar, sempre que possível, a possibilidade de problemas cognitivos para que intervenções acadêmicas adequadas possam ser implementadas.

TDAH em crianças em idade pré-escolar

O Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade geralmente começa antes que a criança ingresse na escola. Entretanto, em crianças em idade pré-escolar, o TDAH é caracterizado não apenas por dificuldades de atenção, impulsividade excessiva e hiperatividade, mas é também frequentemente acompanhado por graves acessos de raiva, comportamento exigente, agressivo e não cooperativo que podem interferir com a frequência à creche ou às instituições de educação infantil, impedimento de participação em reuniões familiares, e que podem se tornar um pesado fardo de cuidados e angústias para a família.66,67,68 Frequentemente, esses comportamentos perturbadores constituem a fonte de preocupações para os pais, e muitas crianças66 recebem o diagnóstico de transtorno desafiador e de oposição. A identificação precoce pode ser útil para abordar inúmeras questões de desenvolvimento que crianças com TDAH podem apresentar.

Avaliações do TDAH em crianças em idade escolar

Frequentemente, professores de sala de aula chamam a atenção dos pais para questões relacionadas ao estilo de aprendizagem e às dificuldades comportamentais da criança em idade escolar. Os educadores geralmente antecipam que no final da educação infantil e no primeiro ano do ensino fundamental, a criança deve ser capaz de seguir rotinas de sala de aula, seguir instruções simples, brincar de forma cooperativa com colegas, e permanecer concentrada de 15 a 20 minutos por vez em uma tarefa acadêmica. Preocupações levantadas por professores, especialmente os mais experientes, fornecem detalhes importantes sobre o funcionamento acadêmico e social da criança. 

O diagnóstico formal de TDAH reflete níveis generalizados e prejudiciais de desatenção, distração, hiperatividade e impulsividade. Os sintomas da criança devem ser discrepantes em termos de desenvolvimento e devem causar um funcionamento deficiente, mais frequentemente em habilidades acadêmicas e sociais, relacionamentos com familiares e colegas. As dificuldades geralmente estão presentes desde a pré-escola, embora nem sempre sejam reconhecidas. Os comportamentos problemáticos são observáveis em mais de um contexto: por exemplo, em casa, na escola ou na comunidade, em saídas para parques ou para a mercearia.

No Canadá, há dois tipos de conjuntos de regras formais que são utilizados para diagnósticos: o DSM IV TR (Diagnostic and Statistical Manual, Fourth Edition, TextRevised) e o ICD-10 (International Classification of Disorders Tenth Edition). O diagnóstico do DSM IV para o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH) reflete amplamente a compreensão geral do diagnóstico nos Estados Unidos. Há três subtipos de TDAH: o tipo basicamente desatento, segundo o qual a criança apresenta seis dos nove sintomas de desatenção; o tipo basicamente hiperativo-impulsivo, segundo o qual a criança apresenta seis dos nove sintomas de hiperatividade e impulsividade; e o tipo combinado, segundo o qual a criança apresenta altos níveis dos dois tipos de sintomas (ver sintomas de diagnóstico no Quadro 1). O diagnóstico do ICD-10 para Transtorno Hipercinético é utilizado com maior frequência por médicos que não exercem sua profissão na América do Norte. Os dois métodos têm diversos pontos em comum, sendo que o diagnóstico de Transtorno Hipercinético do ICD-10 identifica um grupo menor de crianças que devem atender aos critérios para os dois níveis de atividade, assim como para desatenção e distração. Entretanto, quando aspectos de um quadro clínico geral são levados em consideração, crianças com TDAH – especialmente aquelas que apresentam o tipo combinado – apresentam deficiências de funcionamento e necessidades de intervenção semelhantes às de crianças que apresentam transtorno hipercinético.69

A avaliação clínica de uma criança com TDAH deve ser realizada por um profissional da área médica, com conhecimentos pediátricos de avaliação psicossocial e de saúde mental. Uma vez que crianças pequenas frequentemente reagem a circunstâncias estressantes com níveis elevados de atividade e distração, e com dificuldades no aprendizado e nos relacionamentos sociais, é necessário avaliar, sempre que apropriado, os contextos familiares, sociais e de desenvolvimento para identificar explicações alternativas para sintomas disfuncionais. Fatores físicos – tais como sono inadequado, ou condições médicas crônicas – devem também ser avaliados como explicações ou contribuições para as dificuldades da criança. O ideal é que o médico obtenha informações sobre o funcionamento social e acadêmico da criança por meio de pessoas diferentes, que a conheçam em contextos diferentes como, por exemplo, os pais da criança e um professor. Pesquisas com autorrelatos de pais e professores são amplamente utilizadas para obter informações sobre comportamentos específicos da criança no contexto domiciliar ou escolar, respectivamente.4 Além disso, é essencial uma entrevista clínica detalhada com os pais, no caso de crianças mais novas, e com a própria criança, no caso de crianças mais velhas ou adolescentes. Revisar relatórios escolares ao longo de diversos anos também ajuda a obter os pontos de vista de diversos professores, de forma longitudinal. Um aspecto importante da avaliação inclui a identificação de transtornos concomitantes, inclusive transtornos de aprendizagem e de linguagem, como mencionado na seção anterior. Preocupações de ordem psicossocial ou de desenvolvimento devem ser igualmente identificadas, uma vez que podem dificultar o tratamento de TDAH e influenciar o prognóstico de longo prazo. 

Critérios Diagnósticos para Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade do DSM IV TRa

A. Ou (1) ou (2) 

(1) seis (ou mais) dos seguintes sintomas de desatenção persistiram por no mínimo 6 meses, em intensidade desadaptativa e inconsistente com o nível de desenvolvimento:

Desatenção

    1. frequentemente deixa de prestar atenção a detalhes ou comete erros por descuido 
    2. com frequência tem dificuldades para manter a atenção em tarefas ou atividades lúdicas 
    3. com frequência parece não escutar quando lhe dirigem a palavra 
    4. com frequência não segue instruções e não termina seus deveres escolares, tarefas domésticas ou deveres profissionais (não devido a comportamento de oposição ou incapacidade de compreender instruções) 
    5. com frequência tem dificuldade para organizar tarefas e atividades 
    6. com frequência evita, antipatiza ou reluta em envolver-se em tarefas que exigem esforço mental constante 
    7. com frequência perde coisas necessárias para tarefas ou atividades (por exemplo, brinquedos, tarefas escolares, lápis, livros ou outros materiais) 
    8. é facilmente distraído por estímulos alheios à tarefa
    9. com frequência mostra esquecimento em atividades diárias 

(2) seis (ou mais) dos seguintes sintomas de hiperatividade-impulsividade persistiram por no mínimo 6 meses, em intensidade desadaptativa e inconsistente com o nível de desenvolvimento: 

Hiperatividade

    1. frequentemente agita as mãos ou os pés ou remexe-se na cadeira 
    2. frequentemente abandona sua cadeira em sala de aula ou outras situações nas quais se espera que permaneça sentado 
    3. frequentemente corre ou escala em excesso, em situações nas quais isso é inadequado 
    4. com frequência tem dificuldade para brincar ou envolver-se calmamente em atividades de lazer 
    5. está frequentemente "em ação" ou muitas vezes age como se estivesse "ligado em um motor" 
    6. frequentemente fala em demasia 

Impulsividade

  1. frequentemente dá respostas precipitadas antes de as perguntas terem sido completadas 
  2. com frequência tem dificuldade para aguardar sua vez 
  3. frequentemente interrompe ou intromete-se em assuntos de outros (por exemplo, intromete-se em conversas ou brincadeiras) 

B. Alguns sintomas de hiperatividade-impulsividade ou desatenção que causaram deficiências estavam presentes antes dos 7 anos de idade. 

C. Alguma dificuldade causada pelos sintomas está presente em dois ou mais contextos (por exemplo, na escola e em casa). 

D. Deve haver claras evidências de dificuldade clinicamente significativa no funcionamento social, acadêmico ou ocupacional. 

E. Os sintomas não ocorrem exclusivamente durante o curso de um Transtorno Invasivo do Desenvolvimento, Esquizofrenia ou outro Transtorno Psicótico e não são mais bem explicados por outro transtorno mental (por exemplo, Transtorno do Humor, Transtorno de Ansiedade, Transtorno Dissociativo ou um Transtorno da Personalidade).